Sou um corpo repleto de contradições, embebido em infinitas citações, instruções, modos de uso, agenciamentos. Mesmo assim, sou ainda um feixe de luz que, em evidente descompasso, reflete sua intensidade e calor nos diversos contatos, efêmeros e fugazes, que insistentemente explodem diante de mim. Minha sombra, delimitando um volume denso e anteparo para outra luminosidade, impele o observador e qualquer ente sensível a dizer com certeza: A luz é externa! Quanta ignorância, já que para se concluir tal fato é necessária outra intensidade de luz capaz de se fartar de razão.
Similarmente, somos insistentemente bombardeados pelo domínio limitado da arte, como forma e produto, e inseridos em um mercado competitivo que orienta e define valores capazes de silenciar forças intensas, transformando certos padrões artísticos e estéticos em verdadeiros enunciados vanguardistas. Dessa condição, nada mais óbvio do que concluirmos também que, diante da arte instituída, nada resta a fazer, já que somos apenas uma sombra, um rastro perante sua magnitude.
Novamente, teimo em insistir na ausência de sensibilidade para o reconhecimento da força e intensidade do corpo, de suas errâncias, desejos, diferenças. Ao nos permitir o abalo pela eficácia do mercado da arte, aliado à complexa rede de comunicação midiática – fábrica glamurizada de prazer e desejo consumista – somos forçados a aceitar um espaço que nega a evidencia das nossas particularidades e capacidades criativas. Ondas e ondas de informação bombardeiam intensamente nossos sentidos e percepções, transformando a vitalidade da existência em um depósito de detritos aguardando solicitação de uso. Perdidos diante de um desejo de adequação, mesmo que aparentemente transgressor, o corpo – seu corpo/meu corpo/nosso corpo – sente-se desconectado daquilo que é essencial para o domínio de si. A arte, manifestação da existência e de sua vitalidade, que processual e experimental definem diferenças múltiplas, não condiz com a restrita capacidade de absorção do mercado.
Opto, nesse momento, por perceber a grandiosidade das idéias, experiências e sensibilidades de um número diverso de artistas e não artistas que, no fluxo caótico da existência, desejam intensamente dizer o que ainda deve ser dito. Dessas presenças, o que fica é a imensurável relação entre a vida do artista e sua obra, uma determinando a existência da outra, alimentando-a, transformando-a, intensificando o contato com o mundo e sua face trágica.
wagner rossi campos
domingo, 26 de outubro de 2008
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Um comentário:
Que texto mais lindo!...
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